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merda no sapato: Lisboa

sexta-feira, abril 21, 2006

Lisboa

Desde que estou em Lisboa que me tenho deparado com coisas que jamais na minha vida havia experienciado. Sou um tipo provinciano, confesso, aquela agitação provoca-me ainda uma certa estranheza. Tanto tráfego, tanto tráfico numa só cidade, apesar de estar longe de ser uma metrópole mundial, quanto muito uma metrópole europeia, não estou habituado a ambientes deste género e por vezes acabo por sentir-me perdido e minúsculo. Sempre vivi em pequenas cidades, calmas e recatadas, à excepção de Genebra, onde morei apenas até aos seis anos. Estou a gostar, gosto de aventura, quebrar a rotina, mas tenho de aguentar a fase de adaptação, quer queira quer não, principalmente porque fui eu que decidi ir para lá, fui eu que me convenci a mim mesmo, e não aquele vaso vermelho chinês do século XV com quem falei a semana passada, como muita gente pensa.
Por oposição a Nova Iorque gosto de chamar a Santo Tirso, e às vezes até à Covilhã "A terra que nunca acorda." um sítio onde até os criminosos e os homem-canhão morrem de tédio. Para quem não sabe: o maior edifício de Santo Tirso é mais ou menos da minha altura e daria para circunscrever grande parte da Covilhã dentro de uma daquelas rotundas de Lisboa. Dá, por isso, para terem uma pequena ideia de como me sinto. Era como se tivesse saído do congelador para o forno, tal a diferença. Tal como como acontece com os perús. (Sempre me questionei se os perús consideram o Natal um dia Santo, e porque é aquele país da América Central se chama Perú. Terá o seu descobridor, ou achador como se convencionou chamar agora, considerado que a verdadeira comunidade nativa, dado à superioridade intelectual em relação aos indíos da altura, serem os perús? Também penso noutras coisas deste género e é por isso que ultimamente não tenho arranjado muitos novos amigos.)
Em Lisboa não é só a arquitectura que é diferente, também as pessoas e até os próprios cães. Aliás, principalmente os cães. Desde pequeno que tenho a tendência de me dar melhor com cães do que com pessoas, o que por vezes é chato, quando vejo cadelas com o cio por exemplo, as pessoas têm dificuldades em perceber a minha orientação sexual. Ao menos em Lisboa já não ligam tanto a isso, mas os cães esses, bem, os cães já não são tão afáveis. Tive recentemente uma experiência que quase me deixou devastado, tanto psicológicamente como fisicamente. Conheci uma raça completamente nova de canídeos - os cães de Restelo. Vocês podem não se acreditar mas não existe um único cão no Restelo amigável, até agora já me cruzei com três deles e três deles tentaram-me matar. Graças a Deus nesses dias não tinha tomado banho, os canideos sempre foram conhecidos por terem um olfacto apurado e talvez tenha sido esse o motivo para pouco depois se terem afastado incomodados. Nem sequer quero imaginar o horror nas suas pobres e compridas narinas. Doce vingança, é para aprenderem a não se meterem comigo! No entanto deu para sentir o coração a acelerar, é que em todos os casos não tinha praticamente hipótese de fuga. No entanto no final, depois de pensar um bocado naquela situação, senti um misto de orgulho/felicidade, agora a música "Cheira a Lisboa" deixa de fazer qualquer tipo de sentido.
Estava aqui a pensar, se calhar, se calhar o meu mau cheiro até foi o motivo inicial para me quererem morder, mas seria estranho tendo em conta que eles comem os seus próprios dejectos e até prova em contrário, com um certo orgulho. Como poderia isso os incomodar? Se calhar foi por eu ser um playdog, quase toda a população canina o sabe e por vezes, os machos invejam-me. Só pode ser isso, eu não estou assim à tanto tempo sem me banhar, se querem mesmo que vos diga, acho que a última vez até foi uma semana antes da Páscoa... de 2002.
Mas chega de cães. As pessoas. Os Lisboetas são afáveis ao contrário do que muita gente pensa, principalmente no Norte, falo por mim, que estou habituado a que me olhem de alto a baixo e de baixo a alto por causa das roupas (sou hippie), aqui mal dão por mim de tantos malucos que se vêem. Ainda há pouco tempo vi um tipo de rastas vestido com um colete reflector e em baixo com uns calções. Era noite e estava um frio de rachar. Já na Covilhã sou um sujeito muito estranho e extravagante, lembro-me que a última pessoa com quem falei perguntou-me se já tinha encontrado a nave-mãe. Curiosamente essa pessoa era bastante parecida comigo e falou-me se não me engano, numa altura em que olhava para o espelho.
Outra coisa estranha que tenho visto amiúde são aqueles anúncios preventivos de uma campanha alertando para os perigos dos ataques cardiovasculares. Já tinha visto aquelas marcas no chão muitas vezes, mas em Lisboa tem quase em todas as ruas. É estranhíssimo. Imagino o que sentem os estrangeiros quando veêm visitar Portugal, a ideia com que eles ficam de nós. Aposto que no dia seguinte embarcam logo para outro sítio. "Foda-se, só mortos! Vamo-nos embora que esta treta de país tem demasiado crime, bora mas é para o Rio de Janeiro, para a cidade de Deus, lá tem uma cena chamada Cristo-Rei e as miúdas dançam nuas e fornicam nas esquinas!" E lá se vão embora sem saberem o que perdem. Eu cá não perco nada, vejo cada pérola. Anteontem vi um cartaz numa central rodoviária dizendo
"Aqui é proíbido afixar cartazes", achei piada, fez-em lembrar aquele autocolante que dantes se via muitas vezes "as minhas convicções não são para ostentar em público!", depois vi num supermercado a letras gigantes e garrafais estampadas contra a parede o seguinte "Benvindo à Xabregas"... à Xabregas... à Xabregas?!

Também gosto muito do Porto...